H@ vida depois dos 60

…com pensamento, opinião e poesia em doses homeopáticas…

arquivos do mes de janeiro, 2005

colibri

na fuga

um travo de fel

na busca

um favo de mel

mas nenhum naco recebi

lépida partiste

e no silêncio morto

me envolvi

voaste em solo

deixando-me sozinho

a trinar desafinado

desarvorado colibri

pensado por Tarciso comente

sublimações

Nem só de poesia o viver. Às vezes tenho gana de render-me ao sorvedouro das mudanças. Encetar uma viagem bandida sem portos delineados. Romper todas as instâncias dos consensos, da decência, das censuras. Mas o passo não é alçado e a saliva é engolida sem o naco desejado. Sublimo. Reprimo. Choro de saudades de algo que não foi vivido e nem completamente sonhado. As culpas sobrevêm. Me abastei de bem-estar. Sinto-me envolvido em atmosfera serena. Ausente apenas o fator surpresa. As mais intensas interjeições exclamativas não pertencem ao meu universo. Meu mover é metódico, milimétrico, completamente previsível… Quando tudo está bem, tudo está bem. Quando algo não vai bem, nada vai bem… Desabafo. Desafogo. Me volto ao meridiano propenso a fugir das sombras… Agradecido constato o óbvio nem sempre ostensivo ou encantador: estou bem vivo e vivo bem. Isso devia bastar e me fazer transbordar gratidão. Mas não… E vem o arrependimento por me render aos lamentos sem ter o que lamentar…

pensado por Tarciso comente

sobrevôos

sou perfeita imperfeição

quando me vejo no chão

tenho asas pra cuidar

e quando plano liberto

vejo a terra a descoberto

onde tenho que pousar

transmuto meus elementos

água fogo terra e ar

queimo as dores

bebo as flores

do meu aterro um hangar

nele habito e descortino

um infinito voar

pensado por Tarciso comente

desejos

desejos plenos

planos em ciclos

que rodopiam

volvendo ao mesmo lugar

há que recomeçar

nesta lágrima pingente

rolando a face enxuta

febril cansaço das lutas

e as letras despejadas

carregadas de non-sense

dimensões quase minúsculas

já fulgura alaranjado

meu crepúsculo solar

adentro às quatro luas

de alma nua

querendo calar

no embriagante silêncio

a ruminar os desejos

sublimados ternamente

nos porões da minha mente

e em seus desvãos inocentes

onde podem sem censura

em clausura se abrigar

pensado por Tarciso comente

porvir

contemplo uma infinidade de paradoxos

situações inverossíveis que incomodam

mas a vida as encaixa em seu bojo

carrego silencioso meus estojos

entre os lápis-de-cor da infância

que muitos arco-íris desenharam

e dramas de certos acontecimentos

momentos marcantes

que fizeram cicatrizes e se eternizaram

se ostento agora um sorriso largo

é porque graças a Deus as tenho superado

e talvez sejam até minha riqueza

força e perseverança dos meus passos

na inconstância das certezas perseguidas

me sinto agora bem-aventurado

e espero prosseguir

rumo a um porvir ainda mais abençoado

pensado por Tarciso comente