Alguma coisa no tempo me absorve em extenuante trabalho inútil da mente. O tempo passa. Na parede, quase desapercebido – meu relógio muito antigo marca sem saber essa passagem. É máquina, mas é personagem de uma história. Me lembro dos meus primeiros contatos com ele. Seus tique-taques monocórdios só pareciam interrompidos pelo badalar das horas cheias e de suas metades. Criança ingênua – a ingenuidade era minha companheira inseparável – eu via a alma do relógio e desde então eu já sabia que teríamos um caso de posse mútua. Tenho eu esse relógio ou será que ele me tem?! Não sei. Na verdade ele sempre marcou as minhas horas. Mesmo quando eu já não estava por perto e fui embora pra cidade. Primeiro a pequena e depois a grande. Meu relógio – que ainda não era – a esperar num compasso repetitivo e paciente. Tique-taque, tique-taque, tique-taque… Blemblom, blemblom, blemblom… Eram três horas da tarde. O sol a pino e um calor que Deus mandava. Os animais no pasto adivinhavam chuva relinchando, correndo, balindo, pastando. Eu chorava num canto sob o meu relógio… Imaginava febril as horas longínquas que nunca chegavam e que ainda não me deixavam partir. Parece que aquelas lágrimas tiveram o condão de acelerar o tempo que não passava e a partir de então, cada dia mais depressa ele foi passando e desgastando os infindáveis tique-taques do velho relógio pendurado. Anos depois, idas e vindas, depois de tantas mudanças o cansaço das viagens. Tanto quanto a mim ele me pareceu tão cansado da última vez que pude ouvi-lo noite adentro em seu balanço nostálgico e hipnótico… Se movia tão exausto e lento que ao clarear do dia seus ponteiros carcomidos amanheceram parados. Quando o moderno celular me despertou olhei-o lânguida e longamente, mirando as figuras gastas de seu vidro amarelado pelo tempo. Um tristonho desalento me envolveu e não tive coragem de girar sua anacrônica manivela que o obrigaria retomar seus movimentos a demarcar meu tempo. Quedei-me absorto e deixei que permanecessem imóveis seus ponteiros e badalo, e que se calassem os seus tique-taques…
15
abr
tique-taques
Alguma coisa no tempo me absorve em extenuante trabalho inútil da mente. O tempo passa. Na parede, quase desapercebido – meu relógio muito antigo marca sem saber essa passagem. É máquina, mas é personagem de uma história. Me lembro dos meus primeiros contatos com ele. Seus tique-taques monocórdios só pareciam interrompidos pelo badalar das horas cheias e de suas metades. Criança ingênua – a ingenuidade era minha companheira inseparável – eu via a alma do relógio e desde então eu já sabia que teríamos um caso de posse mútua. Tenho eu esse relógio ou será que ele me tem?! Não sei. Na verdade ele sempre marcou as minhas horas. Mesmo quando eu já não estava por perto e fui embora pra cidade. Primeiro a pequena e depois a grande. Meu relógio – que ainda não era – a esperar num compasso repetitivo e paciente. Tique-taque, tique-taque, tique-taque… Blemblom, blemblom, blemblom… Eram três horas da tarde. O sol a pino e um calor que Deus mandava. Os animais no pasto adivinhavam chuva relinchando, correndo, balindo, pastando. Eu chorava num canto sob o meu relógio… Imaginava febril as horas longínquas que nunca chegavam e que ainda não me deixavam partir. Parece que aquelas lágrimas tiveram o condão de acelerar o tempo que não passava e a partir de então, cada dia mais depressa ele foi passando e desgastando os infindáveis tique-taques do velho relógio pendurado. Anos depois, idas e vindas, depois de tantas mudanças o cansaço das viagens. Tanto quanto a mim ele me pareceu tão cansado da última vez que pude ouvi-lo noite adentro em seu balanço nostálgico e hipnótico… Se movia tão exausto e lento que ao clarear do dia seus ponteiros carcomidos amanheceram parados. Quando o moderno celular me despertou olhei-o lânguida e longamente, mirando as figuras gastas de seu vidro amarelado pelo tempo. Um tristonho desalento me envolveu e não tive coragem de girar sua anacrônica manivela que o obrigaria retomar seus movimentos a demarcar meu tempo. Quedei-me absorto e deixei que permanecessem imóveis seus ponteiros e badalo, e que se calassem os seus tique-taques…
pensado por Tarciso (1) Comentário
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Nossa que Lindo!!
Voltei no tempo da minha infância, das minhas férias na casa dos meu avós.. em fim, voltei no tempo com o som do seu Tic.. Tac..